BARCO PARADO NÃO FAZ VIAGEM

Inês Sapeta Dias e Patrícia Pimentel

Duas mulheres viajam a bordo de uma casa que se está a afundar na Ilha do Pico, Açores. Têm vontade de começar do zero ou até antes. Enquanto esperam, constroem castelos de cartas escritas e de postais nunca enviados.Tecem o filme como esses castelos de cartas, montados num tabuleiro instável que resvala com o mar.

Na sala está a mala vermelha que levaram com as fotografias das viagens que fizeram juntas. E no sótão descobrem as fotografias de uma mulher que ainda hoje vive nesta casa. Desenham num mapa o traço da viagem que ela fez entre o Pico e o Havai (ou ao contrário?), de barco e de comboio, em 1915, e juntam as fotografias e os postais que ela coleccionou no trajecto – é uma só mulher numa ilha de homens. À medida que vão permanecendo na casa, este arquivo começa a misturar-se com o delas, até já não se saber de quem é. O mar bate nas fundações da casa e as loiças batem umas nas outras e a madeira range. O vento fura as frestas e grita na porta da cozinha.O filme é a arquitectura, real e imaginária, dessa casa e desse arquivo que se faz, desfaz, refaz (como as ondas).Olham em volta, e ocorre-lhes, de repente: quais destas coisas em que mexemos vão ficar depois de nós